segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

Mães de plantão

O brasileiro precisaria ter, eternamente, uma mãe de plantão. Uma daquelas mães bem chatas, que o obrigariam a levar o casaquinho num domingo ensolarado, porque com certeza vai esfriar depois. Daquelas que o impediriam de fazer as coisas absurdas que geralmente faz quando não tem a mãe por perto – e acaba pagando caro por isso.

 

O brasileiro se julga invencível, indomável, invulnerável, imorrível, imbroxável e incomível, e só a mãe a seu lado para lhe mostrar o contrário. Detalhe: a mãe de plantão deve viver para sempre, ou pelo menos até o dia em que o filho morra, preferencialmente de causas naturais.

 

Exemplo recente da falta que a mãe faz: vocês acham que cem mães permitiriam que cem filhos atravessassem ao mesmo tempo uma ponte pênsil que tem uma placa na entrada, alertando para a capacidade máxima de vinte pessoas por vez?

 

- Ah, mãe, mas todo mundo vai!

 

- Você não é todo mundo!

 

Mas não tinha mãe nenhuma de plantão, as cem pessoas sem mães de plantão atravessaram a ponte pênsil de trinta metros sobre o rio Mampituba, divisa de Santa Catarina com Rio Grande do Sul – repito: ultrapassando em cinco vezes a capacidade declarada da ponte – e a estrutura cedeu. Até o momento em que eu escrevia este texto, havia cinco desaparecidos.

 

Isso me lembra de um outro caso antigo, com falha indesculpável das mães de plantão: um grupo de estudantes da Universidade de São Paulo saiu de uma festa no próprio campus e decidiu ‘esperar o tempo passar’ num prédio inacabado dentro da Cidade Universitária.

 

O grupo não respeitou as restrições de acesso à obra – uma cerca com a tela devidamente cortada por visitantes anteriores e algumas fitas de contenção – e entrou no prédio para, segundo alguns, ver o sol nascer. Ali dentro, uma estudante de Letras de 19 anos saiu em busca de um banheiro pelos corredores escuros, tropeçou num monte de entulhos e despencou no poço do elevador, de uma altura de três andares, morrendo ainda no local.

 

A primeira reclamação de seus colegas foi com relação à falta de um sistema de vigilância que os impedisse de ter entrado naquele lugar potencialmente perigoso. Ou seja: eles invadiram um lugar que todos sabiam proibido, invadiram uma área que todos sabiam precária, por estar em obras, e a culpa pelo incidente é da Universidade – ou do Instituto Butantã, a quem pertence o prédio – por não colocar guardas suficientes em torno da edificação, para impedir a invasão?

 

Uma reação absolutamente normal, eu diria: o brasileiro é como uma criança mimada, que quer fazer o que lhe dá na telha, mas quer que alguém responda pelas consequências de seus atos. Quer enfiar o dedo na tomada e, após o choque elétrico, quer que seus pais sejam interpelados pelo Conselho Tutelar, por incúria. Pois eu acho que as mães de plantão resolveriam.

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